Mick Jagger ganhou fama de pé-frio na Copa da África do Sul,
em 2010. Bastava o vocalista dos Rolling Stones eleger uma seleção para
torcer que esta era quase que sumariamente eliminada do Mundial. O azar
no futebol não contaminou o sósia dele no Brasil. Reconhecido pela
semelhança com o cantor inglês, o boleiro aposentado Iedo Morgado, aos
43 anos, se aventura como treinador. Comandando o Estanciano na primeira
divisão do Campeonato Sergipano, o 'cabeleira' se mostra um pé-quente.
Assumiu o Canarinho na zona do rebaixamento, sem nenhum ponto
conquistado e em uma situação financeira bastante adversa. Em dois
jogos, o jovem treinador somou duas vitórias, ambas sobre times de
tradição e candidatos ao título (Sergipe e Itabaiana), campanha
suficiente para tirar a equipe estanciana da zona da degola.
Iedo é conhecido como Jagger do Nordeste (Foto: Montagem)
- O time é bom, mas os resultados não estavam vindo. Quando assumi,
procurei conversar bastante com o grupo e mostrar a ele o que eu queria e
o que eu achava que poderia ser melhorado. Graças a Deus eles
entenderam e são responsáveis por essa mudança. Ainda não está bom.
Temos duas vitórias e precisamos de mais resultados positivos para
afastarmos de vez o risco de rebaixamento. Espero confirmar lá no final
do campeonato esta fama de pé-quente.
Apelidado de 'guitarrista' nos tempos de jogador por causa das longas
madeixas, Iedo diz que as comparações com Jagger são recorrentes desde a
juventude. O visual de roqueiro sempre agradou ao público feminino,
tanto que ele herdou do astro original a fama de conquistador.
- Isso foram outros tempos. Agora estou mais sossegado. Eu me casei
cinco vezes, mas não quero mais saber disso. Estou bem com a minha
esposa e ela será a última. Não haverá outra. Está muito bom como está.
Deixa essa fama agora para o Mick Jagger lá - comentou Iedo, que também
falou que as comparações com o cantor nunca o incomodaram.
- Não gosto de viver de aparências, mas sou vaidoso, principalmente com
o cabelo. Eu sempre usei cabelo grande e por isso sempre me compararam
com o Mick Jagger, mas eu sou mais bonito que ele, só que não sei cantar
(risos). Gosto de música, sou do rock também. Ser comparado a um cara
talentoso e mundialmente conhecido não é problema nenhum para mim.
Astro da bola
Iedo não teve vida de astro como Jagger. Mas também fez o seu sucesso
nos gramados nordestinos. Ele estourou em 1987 jogando pelo Vitória.
Franzino, rápido e muito habilidoso, caiu nas graças da torcida
rubro-negra.
- O sucesso no Vitória foi muito rápido. A realização de um sonho para
mim. Sempre fui torcedor do time e queria muito vestir aquela camisa.
Meu primeiro gol pelo Vitória foi veiculado no Fantástico. Uma emoção
muito forte. Tive uma identificação muito grande com a torcida. Já
joguei na Fonte Nova cheia. Mais de 70 mil pessoas gritando o meu nome.
Algo inesquecível.
No Leão, Iedo Morgado conquistou o bicampeonato baiano em 89 e 90. Ele
fez parte de um dos grandes times do Vitória na década de 90, que tinha
ainda Roberto Gaúcho, Missinho, Hugo e André Carpes.
Iedo foi bicampeão baiano pelo Vitória
Foram ao todo 20 anos de carreira e 20 clubes diferentes na vida do
Mick Jagger do Nordeste. Ele foi reverenciado por baianos e paraibanos
no auge da trajetória como jogador. No Treze de Campina Grande, ficou
conhecido como o rei das bicicletas.
- Fui muito feliz no Treze também. Anos muito bons. Lá fiz muitos gols
de bicicleta. Por isso ganhei esse apelido. Por incrível que pareça
nunca treinei esse fundamento, mas meu físico ajudava. Eu era leve e
sempre conseguia acertar.
Tragédia
Destaque nas principais equipes do Nordeste, o Mick Jagger baiano
começava a despertar a atenção de clubes do eixo Rio-São Paulo. O
atacante recebeu sondagens do Botafogo e do São Paulo. Mas um incidente
acabou interrompendo a carreira promissora de Iedo. Em 1991, ele se
envolveu em um acidente de carro e por pouco não morreu. A delegação do
Vitória estava na estrada rumo a Riachão do Jacuípe, quando o ônibus que
transportava os jogadores quebrou. Os atletas foram divididos em carros
de passeio para seguir o roteiro. O automóvel em que ele estava acabou
batendo.
- Foi um dos momentos mais difíceis da minha vida. Estava no auge da
minha carreira e veio esse acidente. Fiquei quase dois anos longe do
futebol por causa disso. Passei três meses em uma cama sem poder
levantar. Machuquei a cabeça, quebrei a bacia, fraturei a clavícula.
Ninguém mais acreditava que eu pudesse voltar a jogar.
Apesar da grande tragédia, ele ressurgiu para a vida e para o futebol.
Mesmo sem conseguir o mesmo brilhantismo que prometia antes do acidente,
preferiu substituir as lamentações pelo aprendizado.
- O acidente foi uma coisa que acabou sendo positiva na minha vida. Por
incrível que possa parecer. Eu não estava preparado para o sucesso.
Subiu pra cabeça. Estava soberbo, humilhando as pessoas, brigando com
jornalistas. O acidente me fez refletir sobre muitas coisas. Mostrar que
eu não era o todo poderoso, que eu precisava mudar minha postura. Foi
uma grande lição. Se eu não recebesse essa lição, seria um homem perdido
hoje. O acidente me tornou um cara melhor.
Ao se recuperar do acidente, Iedo não conseguiu outra chance no
Vitória. Ficou encostado quase um ano, até que em 1993 se transferiu
para o Confiança. Ele ficou dois anos no time azulino. Não conquistou
títulos. Mas deixou um saldo de 31 gols marcados.
- Nós tínhamos um time bom. Mas infelizmente não conseguimos nenhuma
conquista. Enfrentamos o Sergipe em uma grande fase, em plena campanha
do hexa. Tinha muita gente boa lá, como Sandoval e Elenilson. Realmente
era difícil superá-los.
Em 93, primeira temporada dele com a camisa proletária, o Vitória
chegava ao vice-campeonato brasileiro. O time caiu na final para o
estrelado Palmeiras, comandado pelo Luxemburgo.
- Foi um choque muito grande para mim. Imagine como foi ver o Vitória
na final do Campeonato Brasileiro e eu não estar lá. Eu era a grande
estrela daquele time. E vi companheiros meus como Dida e Alex Alves
disputando um título daquela importância e eu estava aqui no Confiança,
disputando o Campeonato Sergipano. Mas isso ficou para trás. Eu só tenho
a agradecer na minha vida ao Confiança. Foi o time que me deu a mão
quando eu mais precisei. Hoje, mais maduro, vejo que valeu a pena cada
minuto que vivi lá. Fui muito feliz no Confiança e me dediquei muito
enquanto estive no clube. Só tenho a agradecer a todos.
Iedo também brilou no Treze
Após deixar o bairro Industrial, Iedo perambulou por vários clubes do
Nordeste até encerrar a carreira em 2007, no Ferroviário do Ceará. A
trajetória como treinador profissional inicia apenas seis anos depois de
pendurar as chuteiras.
- Não queria que na minha cerreira saísse de jogador profissional hoje
para virar treinador amanhã, porque você leva vícios de jogador para a
nova função. Passei um bom tempo na base, trabalhei com futebol feminino
e fui auxiliar. Agora quero o meu lugar ao sol. Quero consolidar minha
carreira de treinador.
O primeiro desafio já foi imposto: fazer com que o time de Estância ao
menos sobreviva na primeira divisão. O próximo passo é, por que não?
Tentar uma conquista com o modesto Canarinho. A missão é das mais
difíceis. Ele próprio reconhece. Mas se depender da afinação do 'Mick
Jagger' com o elenco estanciano, o caminho para as paradas de sucesso
nos palcos do Sergipão pode nem estar tão distante assim.
Iedo quer que Estanciano se acostume a ganhar (Foto: Filippe Araújo / ADC)
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